Desde sempre proliferaram profissões e atividades que viviam da
complexidade e da falta de transparência dos processos da administração
pública, como é o caso dos solicitadores, advogados, sociedades gestoras
de investimentos, etc., que exploram e alimentam esta intermediação, ao
abrigo de uma legislação, ela própria na sua maioria produzida pelos lobbies interessados junto do Governo e da Assembleia da República.
Mas na atual conjuntura de crise económica, estamos a assistir a uma
verdadeira espiral de “oportunismo procedimental” em que os criminosos
conseguem escapar e quem é justo e tem o infortúnio de se ver enredado
em processos Kafkianos, acaba quase sempre por pagar a dívida com
despesas acrescidas e de conveniência para muitos agentes de justiça
intermediários nas litigâncias.
Vejamos o caso dos fiadores que são
surpreendidos de um dia para o outro com a penhora da sua habitação,
porque a pessoa fiada não cumpriu com as obrigações acordadas em
contratos de arrendamento, financiamentos bancários, etc.. Nestes casos,
quase sempre, quando se inicia um processo de execução ou de penhora,
surge um batalhão de sanguessugas prontas a intermediar a litigância e a
tirar o máximo partido da situação. Antes de mais nada os advogados sem
escrúpulos da parte executora, quando farejam que há bens e dinheiro no
fiador, fazem tudo para quebrar a comunicação entre as partes e
evitam resolver de mútuo acordo a quitação imediata da dívida, ocultando
mesmo à parte executada e aos seus advogados a intenção de abrir um
processo executivo de penhora. Trata-se de uma estratégia protegida pela
lei, para surpreender a outra parte e tirar o máximo benefício
financeiro do fiador.
Todas as leis presumem comportamentos e neste
caso presume-se que para além dos devedores, todos os seus fiadores são
vigaristas e maus pagadores. Os pagamentos das despesas judiciais são
antecipadamente garantidos e capturados nos vencimentos ou nas pensões
dos fiadores, mais uma vez de forma coerciva e sem qualquer aviso
prévio, como se os fiadores fossem responsáveis pelo crime de terem sido
avalistas de um amigo ou familiar. Este processo é assegurado por
solicitadores que atualmente têm acesso em nome do Estado a informação
patrimonial privilegiada e cobram por esses serviços valores
verdadeiramente absurdos e despropositados em relação aquele tipo de ato
administrativo. A penhora das pensões é simultânea à penhora de bens e
os agentes de execução são livres e têm todo o poder e capacidade de
cobrança coerciva.
Se pensarmos que a maioria dos fiadores são
pessoas idosas que possuem alguns bens de valor penhorável, acaba por
ser mais uma agressão ao sector da sociedade mais vulnerável e
desprotegido pelas leis e pelo Governo do país. Definitivamente este
país não é para velhos.
Na situação atual da economia, as pessoas
que estão atualmente mais a beneficiar com a crise e o desespero dos
incumpridores, são exatamente os agentes de justiça, nomeadamente os
advogados sem ética e os solicitadores que atuam em nome do Estado,
contratados como se fossem verdadeiros “cobradores de fraque”. Existe
uma verdadeira cumplicidade perversa entre o Estado e os agentes
privados da justiça, pois alguns organismos e fundos autónomos do
Ministério da Justiça, acabam por ser parte interessada nos dinheiros
cobrados aos incautos, que alimentam remunerações acessórias e a
autossustentação de estruturas com autonomia financeira e sede de
receitas próprias.
Onde estão e como atuam os reguladores, como a
Ordem dos Advogados e a Câmara dos Solicitadores? Será que o seu papel é
apenas garantir o “negocio” dos seus associados ou será que devem zelar
pelo cumprimento da sua ética profissional? Poderá ser tudo feito “ao
abrigo da lei vigente”, mas há limites éticos que não podem ser
ultrapassados.
Os verdadeiros vigaristas e incumpridores colocam-se
quase sempre a salvo, pois um país onde a justiça não funciona e a ética
não é respeitada, torna-se um paraíso para criminosos e maus
investidores e um calvário para aqueles que cada vez menos estão
integrados na economia formal como trabalhadores por conta de outrem ou
vivendo da sua pensão.
Não admira que haja cada vez menos pessoas
dispostas a serem fiadoras de pequenas transações ou negócios, o que
contribui para a paralisação da economia e para o agudizar do
individualismo e da desconfiança na sociedade portuguesa. A lei da selva
começa a vigorar e os oportunistas estão a proliferar em todos os
sectores.
Numa altura em que o Governo acabou de anunciar estímulos
fiscais ao investimento, parece que o empreendedorismo para jovens
passará a ser uma miragem no nosso país, pois ninguém mais irá ser
fiador quando corre o risco de ser tratado como criminoso e ver os seus
bens penhorados e serem alvo de assaltos por parte de sanguessugas que
se aproveitam da crise para ganhar dinheiro fácil. Os jovens de hoje em Portugal estão num verdadeiro ciclo vicioso, não só não conseguem emprego porque não têm experiência, mas também não podem arrendar casa ou criar o seu próprio negócio porque no atual contexto não conseguem ter acesso a um fiador.
quarta-feira, junho 19, 2013
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