sábado, dezembro 16, 2006

Mais 200 "Lojas do Cidadão" ou "Balcões Únicos"?



360º em torno do Cidadão!


O Governo acabou de anunciar a criação de mais 200 novas “Lojas do Cidadão” e parece que adiou a implementação do conceito de “Balcão Único”.
Parece que em vez de uma efectiva desmaterialização e integração digital de serviços, que se esperaria do “Balcão Único”, anunciado no programa do XVII Governo Constitucional e perseguindo uma perspectiva de legislatura apenas de curto prazo, vamos ter mais do mesmo com a simples concentração física em “centros comerciais de serviços públicos” de serviços tradicionais do tipo “Loja do Cidadão”.
Espera-se que o anúncio de criação de mais 200 lojas do cidadão espalhadas por todo o país, já de si bastante dispendiosas, traga vantagens não só para o cidadão mas também para a redução da despesa pública. Esperamos que não se trate apenas de projectos mais uma vez de construção civil e mediação imobiliária, mas de baixo valor acrescentado do ponto de vista tecnológico como tem acontecido até aqui.
Infelizmente, apesar de existirem quase 18 mil locais de contacto com o cidadão em todo o país, a administração pública parece persistir na abertura de novas lojas do cidadão sem fechar muitos dos pontos de contacto de proximidade que porventura se tornarão desnecessários.
No comércio privado tem-se assistido à alteração de hábitos de consumo através de uma progressiva concentração de lojas em grandes espaços comerciais, acarretando inevitavelmente o fecho de muitas lojas de proximidade. Nenhuma empresa privada se pode dar ao luxo de manter e acumular lojas em espaços comerciais e de proximidade.
Espera-se portanto que se preveja o fecho de pelo menos o triplo das lojas que se vão abrir de novo, ou seja, esperamos que se abram 200 “centros comerciais de serviços públicos” mais modernos e eficientes, mas se fechem pelo menos 600 espaços de proximidade que se encontram antiquados e pouco eficientes.
Mais do que isto esperar-se-ia o reaproveitamento dos actuais espaços públicos e a requalificação de funcionários, porventura reaproveitados da "Mobilidade Especial", para a intermediação entre os 63% dos portugueses excluidos digitalmente (*) e os portais de serviços acessíveis através da Internet e progressivamente mais integrados e orientados às necessidades básicas dos cidadãos e das empresas.
Parecia que a evolução do conceito de “Loja do Cidadão” para “Balcão Único” tinha este propósito, mas ainda estamos longe de alcançar este estágio de maturidade.

(*) Segundo os dados do INE para 2006



Eu escrevi em 1998, no livro "O Futuro da Internet", o seguinte

(que me valeu muito desconforto na altura):




A criação dos "Centros de Formalidades das Empresas" e das "Lojas do Cidadão" tanto podem ser uma grande oportunidade como podem transformar-se numa mera operação de cosmética sem qualquer mudança de fundo no actual estado de coisas. O conceito de "one-stop-shopping" que parece estar por detrás destes novos "centros comerciais" de serviços públicos só poderá resultar em vantagem para os cidadãos se as várias fases burocráticas dos processos de resolução de problemas estiverem sincronizadas através da automatização de fluxos de trabalho inter-departamentais.
Se não houver sincronia, reutilização de informação e automatização de processos não passa de uma mera reinvenção dos velhos Terreiros do Paço adaptados aos novos hábitos de consumo deste final de século. Já não se trata de dar a volta às arcadas dos antigos ministérios com o chapéu na mão, mas percorrer novos corredores e novas "lojas" independentes de serviços públicos que de uma nova forma simpática e vistosa nos exigem as mesmas burocracias e as velhas formalidades de sempre.
A Internet, as Intranets e as Extranets são a grande oportunidade para realizar com sucesso estas novas lojas virtuais nas quais serão produzidos serviços reais e de grande utilidade para os cidadãos e agentes económicos. Com a utilização de cyber-quiosques e de postos públicos de atendimento que permitem o acesso à Internet, directamente ou através de intermediários de informação bem treinados, a distância deixa de ser um factor relevante para a obtenção de produtos e serviços de caracter universal. Com a sincronização dos serviços, através de cadeias e processos digitais, o tempo torna-se mais curto e a burocracia torna-se mais rápida, mais barata e menos penosa para toda a sociedade.
A evolução para as novas Lojas (Digitais) do Cidadão e para os novos Centros (Digitais) de Formalidades é uma inevitabilidade para o século XXI, em que o tempo, a distância e o custo de acesso deixarão de ser relevantes para o cidadão comum.
Este objectivo passa por uma profunda reengenharia de processos administrativos em que os aspectos tecnológicos são os menos relevantes face às barreiras psicológicas, sociais e políticas que teremos que ultrapassar. Temos que destruir muralhas de poder e construir pontes digitais entre os vários organismos envolvidos na prestação de serviços aos cidadãos e às empresas. A Internet está aí para nos servir, esteja ela onde estiver: Em nossas casas, em quiosques públicos, na futura televisão interactiva, nas escolas, nas bibliotecas ou nos serviços de atendimento em geral.

domingo, novembro 26, 2006

Soberania, actores e cadeia de valor dos SI/TI na AP


Mostramos aqui um diagrama esquemático da relação entre a cadeia de valor dos SI/TI e os vários intervenientes em cada uma das diferentes fases, destacando em sombreado as competências de maior soberania por parte do Governo e da Administração Pública.
Mesmo nos programas de reforma mais recentes, ainda não ficaram claras as missões e as competências no âmbito dos SI/TI, que deveremos proteger de forma soberana e aquelas que se devem externalizar de forma mais eficiente e económica, mas se algum dia tivermos de escolher ou nos faltarem recursos para cobrir todas elas internamente, sem dúvida que protegeríamos as duas primeiras (Arquitectura e Gestão) e não hesitaríamos em descartar a terceira (Engenharia).
É aqui que entra o paradoxo do outsourcing, ao exigir que se garantam internamente níveis mínimos de competência tecnológica, para que se possam cumprir, com credibilidade e profissionalismo, relações independentes e sustentáveis com parceiros, clientes e, acima de tudo, com o mercado das tecnologias. Infelizmente ainda assistimos demasiadas vezes à contratação externa de diagnósticos e planos estratégicos de SI/TI, cujas soluções acabam quase sempre por ser implementadas pelos mesmos fornecedores, de forma promíscua e contra todas as regras de segregação de competências.
Mesmo quando segregamos funções de maior soberania e de natureza conceptual, separando-as das funções de engenharia mais operacionais, devemos acautelar sempre um equilíbrio mínimo de competências multidisciplinares capazes de manter o respeito e a credibilidade técnica em todos os domínios dos SI/TI. As funções mais soberanas, que devemos desenvolver e proteger internamente, exigem muita maturidade e uma leitura atenta às inovações, às tendências e ao mercado, quase sempre decorrentes da experiência e aprendizagem contínua em comunidades de prática, no entanto estas competências não se podem tornar reféns nem se devem deixar facilmente deslumbrar com “habilidades” tecnológicas proprietárias e conjunturais.
Infelizmente a maioria dos organismos de SI/TI ainda se limita a desenvolver competências produtivas em vez de competências gestionárias e raros são aqueles que se prepararam para uma relação adequada e profissional com o mercado.

Uma mistura explosiva na governação dos SI/TI na AP



A pretensa criação de alguns serviços partilhados, os quais caem demasiadas vezes na tentação de se transformarem em autênticos serviços centralizados, dotados de soberania e poderes de coordenação, nada tem a ver com a simples prestação qualificada de serviços internos, convenientemente contratualizados com clientes que jamais devem abdicar da sua capacidade de gestão e soberania, serviços estes que são justificados numa lógica estritamente empresarial e numa mera relação de cliente-fornecedor.
A centralização de serviços é quase sempre inimiga da partilha de serviços, uma vez que a centralização se baseia em relações de obediência a uma qualquer autoridade dotada de competências soberanas e a partilha deverá basear-se na celebração (muitas vezes concorrencial) de contratos de prestação de serviços e na garantia de níveis de qualidade devidamente acordados entre fornecedor e cliente.
Apesar da defesa do modelo de serviços partilhados ser evidente no PRACE, no que se refere aos SI/TI, a confusão persiste como se fosse um mundo completamente à parte e desconhecido.
No que se refere à coordenação, reconheço que para os organismos que se habituaram a prestar serviços de forma mais ou menos centralizada ou partilhada aos restantes departamentos do seu ministério, não vai ser fácil ganhar credibilidade e respeito por parte da classe política e dos organismos parceiros. Se isso não acontecer, estas entidades perderão toda a sua legitimidade e razão de existência enquanto entidades independentes e soberanas.
Formalmente já existiam em cada ministério organismos de coordenação de SI/TI, como entidades coordenadoras sectoriais (ECS), nos termos do Decreto-Lei nº 196/99, no entanto este papel foi apenas exercido de um ponto de vista meramente formal e burocrático, sem que se traduzisse no reconhecimento objectivo desta competência por parte dos restantes organismos.
Quando se trata de organismos ao mesmo tempo coordenadores e executores, assiste-se a um verdadeiro conflito de interesses e a uma encruzilhada de papéis verdadeiramente contraditórios e conflituantes.

Temas relacionados:
Opções para os Serviços Partilhados e TIC na AP

quarta-feira, novembro 22, 2006

“Lançar o barro à parede para ver se pega” - Heróis ou vítimas do PRACE

Pela primeira vez em muitos anos estamos a assistir a um teste à responsabilidade, capacidade de decisão e focagem no essencial dos gestores de topo da Administração Pública.
Como foi anunciado e consta dos relatórios sectoriais do PRACE, é intenção do actual Governo reduzir significativamente o número de cargos dirigentes do Estado. Por isso foi atribuída à generalidade dos organismos públicos uma quota limitada de dirigentes, para serem utilizados numa estrutura mais “magra”, mas mais confinada às atribuições essenciais de cada organismo.
Infelizmente estamos a assistir a uma desresponsabilização e mesmo a uma desobediência generalizada dos dirigentes de topo que, “ensanduíchados” entre as orientações políticas e as pressões das suas actuais estruturas dependentes, preferem continuar a desempenhar o papel de “bonzinhos da fita”, propondo estruturas praticamente idênticas às actuais para agradar aos seus subordinados e remeter para as respectivas tutelas políticas o papel odioso de efectuar os “cortes” menos racionais e até indiscriminados.
No final estes dirigentes de topo que cultivam o "V. Exª decidirá" ficam sempre a ganhar, quer acabem por ser "heróis conquistadores de cargos” suplementares para os seus organismos, quer acabem por ser “vítimas incompreendidas” de políticos intransigentes e determinados.
Esta já é uma prática corrente na elaboração dos orçamentos, em que anualmente se “atira o barro à parede para ver se pega”. Depois os organismos queixam-se que o Governo e em particular os contabilistas do Ministério das Finanças procedem a cortes indiscriminados, não só em “gordura”, mas também no “músculo” e até em “órgãos vitais”.
Esquecem-se que foram eles os responsáveis por não saber nas alturas adequadas decidir e fazer escolhas estratégicas em relação ao essencial do seu negócio.
Lembramos que existem por ai muitos cursos que incluem técnicas de Balanced Scorecard, análises SWOT e matrizes BCG, que fariam falta a muitos dirigentes indecisos e amedrontados com a situação actual.
Estão-se a viver momentos de grande contracção das estruturas do Estado, mas também é a altura adequada para se saber quem são os dirigentes corajosos e responsáveis e aqueles que não passam de "jogadores na roleta do poder" que querem sempre “estar bem com Deus e o diabo”, "agradar a gregos e troianos" e acreditam que é possível "fazer sol na eira e chuva no nabal".
Vamos ver se o PRACE não vai ser mais uma “montanha a parir um rato”, continuando assim a aumentar a espiral do défice em Portugal.
Cada Governo tem os dirigentes que merece!

sábado, novembro 11, 2006

Os dirigentes actuais fazem sobretudo parte do problema e não da solução


As mais de mil páginas do PRACE, ao invés de tornar claras as opções estruturais da Administração Pública em matéria de governação dos SI/TI, permitem leituras subjectivas e implementações orgânicas que servem várias visões e conveniências. Se os organismos de SI/TI quiserem manter-se como estão em torno de funções mais operacionais e auto-protegidas pelo conservadorismo pseudo-tecnológico, haverá com certeza algures no PRACE argumentos que legitimem tal opção, mas se pretenderem mudar para funções mais estratégicas, conceptuais e gestionárias, também não faltará quem se reveja nos termos daquele documento. Sem dúvida que esperávamos referenciais mais claros de um documento que se pretendia estratégico e orientador.
Mais do que nunca, hoje vivemos condições de crise aberta, que se traduzem em oportunidades ímpares de mudança para a Administração Pública e em particular para a forma como encaramos o papel do Estado nos SI/TI. Podemos dizer que vivemos um momento em que se pode mudar, embora persistam sinais de não se querer e também de não se saber como mudar no domínio da governação dos SI/TI no sector público.
Não deixo de concordar e louvar a maioria das iniciativas decorrentes do PEC e do PRACE, mas é urgente definir e clarificar a estratégia e o papel do Estado no domínio dos SI/TI, bem como a vocação e competências dos respectivos organismos, para que possamos usufruir dos benefícios efectivos decorrentes das reformas em curso.
Muitas pessoas em contextos de mudança mal gerida e mal clarificada, evitam envolver-se na solução dos problemas existentes na situação actual, por defesa própria e medo do desconhecido, acabando quase sempre por ser os principais protagonistas do próprio problema, quer por omissão, quer por reacção.
Muitos dos recentes normativos pretensamente orientadores da reforma, nomeadamente as próprias leis orgânicas dos ministérios, não passam de intenções de melhoria mal objectivadas e que deixam demasiada liberdade ao arbítrio dos verdadeiros agentes da mudança, que são os actuais dirigentes dos organismos afectados.
No caso das estruturas de SI/TI a situação é particularmente mais crítica, porque aparentemente não se tratando de "áreas core" do Estado, continua a não existir uma efectiva condução política destes domínios mais ou menos “excêntricos” para a generalidade dos políticos e persiste-se em não se querer perceber a criticidade e urgência da sua governação. São portanto um espaço fértil para a exploração da iliteracia tecnológica de uma certa classe política, que acaba por cair facilmente em estados extremos de terror ou deslumbramento, continuando a ficar reféns de uma tecnocracia cada vez mais florescente e descontrolada.
Os SI/TI têm que deixar de ser entendidos como simples implementações de projectos e “choques” tecnológicos, mas como verdadeiras acções interdisciplinares de mudança, que exigem um olhar cada vez mais estratégico e arquitectónico e uma condução cada vez mais política. A actual indefinição e falta de condução político-estratégica dos SI/TI do Estado, perpetuam a auto-determinação e o conservadorismo de algumas das suas actuais estruturas, a pretexto de uma aparente complexidade tecnológica que se auto-protege e se auto-legitima para se excluir de alguns constrangimentos do processo de mudança em curso.
Como parte interessada e sendo juízes em causa própria, na maioria das vezes os actuais dirigentes fazem parte do problema em vez de contribuírem para a solução e tendem a fazer aquilo que podem para manter tudo na mesma, acabando por desencorajar e inviabilizar todo o processo de mudança (*).
Num processo de mudança como o que se está a viver actualmente, mais do que bons gestores, são necessários bons líderes, orientados por valores, visão, sentimentos, proactividade, comprometimento, persuasão, inovação, flexibilidade, comunicação, etc., mas estes são difíceis de encontrar, quando o que se pretende é apenas conformismo e obediência política, mesmo que isto signifique continuar a actuar no cinismo e em jogos sub-reptícios de poder.
Não se pode temer o conflito e, na actual conjuntura, deve-se utilizar positivamente a energia que dele resulta. A liderança dos SI/TI nos nossos dias exige escolhas e decisões difíceis, por isso tem cada vez mais a ver com a capacidade de lidar com a mudança e o saber construir sem medo um mundo melhor através de uma combinação adequada de pessoas, processos e tecnologias.

(*) Worley e Lawler, “Designing Organizations That Are Build to Change” – MIT Sloan Management Review, Fall 2006, pág. 19-23

domingo, novembro 05, 2006

Não é fácil acelerar os processos, mantendo as garantias do cidadão


A evolução do papel do Estado e as áreas onde vem intervindo, tem muito a ver com a evolução da democracia e decorre do empowerment do cidadão nas suas relações com a administração pública e o poder político.
Chamemos a esta dimensão o eixo do “D” (Garantias Democráticas), que ao longo dos anos foi acumulando não apenas regras e procedimentos burocráticos, mas foi sendo o resultado do reconhecimento de direitos e garantias dos cidadãos, como foi o caso do Código do Procedimento Administrativo, em que são reconhecidos prazos de reclamação aos interessados e com isto foram-se dilatando tempos e formalidades burocráticas.
O eixo do “D” (Garantias Democráticas) acarretou consigo uma dimensão paralela e quantas vezes perversa, a que poderemos chamar o eixo do “B” (Burocracia). Poderemos assim dizer que ao longo dos anos o Estado garante e protector tornou-se muitas vezes num Estado burocrático e bloqueador.
Poderemos concluir que o Estado democrático está em perigo se não forem acelerados os processos e os serviços prestados aos cidadãos e agentes económicos? Se o tempo gasto nas formalidades e nos procedimentos constituírem um embaraço excessivo ao desenvolvimento económico-social, temos que “baixar a guarda” e diminuir o eixo do “D”? Como manter ou até mesmo acelerar o progresso democrático “D” sem custos burocráticos excessivos e contraproducentes “B”?
A resposta está na aceleração dos processos burocráticos, a que chamamos o eixo do “E” (Aceleração Electrónica). Para mantermos ou aumentarmos os níveis do “D” (Garantias Democráticas), temos de saber aumentar proporcionalmente os níveis de aceleração electrónica. A administração pública electrónica torna-se assim um imperativo dos Estados modernos e um garante das democracias, desde que respeite o crescimento sustentado dos dois vectores “E” e “D” e não se tenha de sacrificar o “D” para reduzir o “B”.
É por isso que propomos insistentemente, há já alguns anos, a substituição da maioria das certidões pela troca de bits entre bases de dados, sem necessidade de qualquer intervenção humana, bem como a criação de cadeias de valor baseadas em processos decisórios interdepartamentais e inter soberanos, baseados em workflows cooperativos entre pessoas e máquinas.

A Solidão da Mudança

Quem nalgum momento ousou fazer algumas rupturas e desafiar o statu quo, decerto que sentiu o desconforto e o peso da acusação de não ter seguido sempre na direcção “politicamente correcta”, tendo acabado por presenciar à sua volta o peso da intriga e da inveja, acabando quase sempre por pagar um preço bastante elevado pela opção de caminhar com ética e independência no sentido da inovação sustentável a longo prazo, em vez de se conformar com ganhos e recompensas de curto prazo. As comunidades de prática e o associativismo cívico são quase sempre a saída possível para a realização e o equilíbrio pessoal, quando ainda se acredita no valor da cidadania activa. Por isso ainda estamos aqui neste blog.
A disponibilidade permanente para abdicarmos de cargos e honrarias é portanto uma condição necessária de liberdade e de dignidade pessoal. Quando decidimos fazer uma carreira de inovação e melhoria do Serviço Público, temos que saber pagar, nas alturas adequadas, o preço de nos recusarmos a uma subserviência incondicional à solidariedade institucional e política.
O conservadorismo e a luta por umas migalhas de poder acabam quase sempre em jogadas oportunísticas de bastidores para se continuar a sobreviver nos cargos e a usufruir dos respectivos privilégios.

CIO versus CTO - Uma questão de Confiança e Respeito



As funções de governança dos SI/TI não são iguais em todas as organizações, pois dependem da fase de maturidade em que se encontram os gestores dos recursos informacionais e das tecnologias que lhe dão suporte, as quais tanto podem ser asseguradas por solucionadores reactivos de problemas centrados nas tecnologias, do tipo CTO , como por autênticos CIO que são capazes de agir proactivamente e influenciar a transformação do negócio através da utilização adequada dos SI/TI, de forma co-optada com os seus pares nos níveis mais elevados da gestão e da governança.
Os CIO podem percorrer cinco estágios de maturidade ou de credibilidade segundo o grau de confiança e aceitação que as respectivas estruturas e funções merecem perante a direcção de topo. A gestão dos SI/TI inicia-se quase sempre em fases segregadas de incerteza e cepticismo, aspirando a conquistar progressivamente fases mais maduras de aceitação e confiança, para finalmente atingir o respeito por parte de todos os seus pares e em particular por parte da direcção de topo, que, no caso das administrações públicas, é o próprio Governo.
Associadas a cada um destes estágios, podemos encontrar percepções e formas de gestão diferenciadas, progressivamente mais comprometidas com a organização como um todo. Há medida que se vai progredindo na maturidade da gestão dos SI/TI estes passam a ser capazes de acrescentar cada vez mais valor ao negócio e em contrapartida merecer a aceitação e o reconhecimento de todos os parceiros envolvidos.

sábado, novembro 04, 2006

Será que sabemos qual a verdadeira importância das redes e da interoperabilidade?


Quando falamos em redes e interoperabilidade julgamos imediatamente que estamos a tratar de tecnologia, mas deveremos acima de tudo começar por facilitar a concertação de vontades inter-organizacionais, de forma a assegurar uma visão, um propósito e um compromisso comum. É no plano organizacional que começa a interoperabilidade e é na partilha e na concertação de visões que deveremos à partida investir nas redes. Poderemos chamar-lhe Peopleware, pois é de pessoas e grupos que estamos a tratar neste nível e começamos aqui a lutar contra a incerteza em relação ao futuro e a ganhar níveis mais elevados de sustentabilidade partilhada.
É determinante, ao mais alto nível da interoperabilidade organizacional, saber quem são as pessoas e as entidades que estão voluntária ou involuntariamente presentes ou ausentes à volta da mesma mesa, para se concertarem na resolução de problemas. Trata-se de uma dinâmica de poder que tanto pode servir adhocracias como arenas políticas com propósitos mais ou menos explícitos ou ocultos.
Em seguda, ninguém pode interoperar se não falar a mesma língua e aqui estamos a tratar de um segundo nível relacionado com a interoperabilidade informacional e semântica. Ninguém poderá protocolar acordos e trocar informação se não dispuser de uma língua franca (Infoware). Aqui estamos no plano das convenções e normas (ontologias, metadados, formatos, etc.) e constitui um plano fértil à regulamentação e ao exercício da autoridade normativa. A incerteza é aqui reduzida ao mínimo.
Por fim chegamos à interoperabilidade tecnológica onde acautelamos acima de tudo os graus de conformidade (compliance) entre as soluções disponíveis e os problemas identificados e partilhados nos níveis anteriores. Aqui tudo será mais fácil se soubermos ultrapassar os outros dois níveis superiores.

Para começar, uma página é suficiente (KISS)

A verdadeira Reforma afinal está no Dinheiro e nos "Sabonetes"


A administração pública está hoje a viver o seu período mais conturbado desde há cerca de trinta anos. Parece que mais uma vez não são os valores, que se esperariam do PRACE, que estão a determinar a mudança, pois são sobretudo os argumentos financeiros e estruturais, resultantes de motivações orçamentais urgentes, que estão a tornar a mudança da administração pública efectiva e inevitável.
Por um lado os orçamentos de funcionamento para 2007 estão a ser fortemente reduzidos e por outro a quota de dirigentes, proposta pelo PRACE para as novas estruturas, foi, em muitos casos, limitada a quase metade dos cargos existentes nas anteriores leis orgânicas. Com estas reduções compulsivas e atendendo à rigidez dos orçamentos de funcionamento em matéria de recursos humanos, assistimos a uma cascata de decisões obrigatoriamente induzidas para que os organismos enviem para “mobilidade especial” dezenas de milhares de funcionários, cujas consequências sociais e económicas ainda estão muito mal avaliadas.

Paradoxo da Defesa da Propriedade do Software

Os caminhos da compra legal de software ou da pirataria, ao contrário do que se poderá pensar, não derivam apenas de comportamentos de pessoas e sociedades cleptomaníacas, mas são induzidos por comportamentos pouco éticos de algumas empresas e por opções políticas de certos Governos que acabam por lhes dar cobertura.
Com efeito, algumas empresas começaram por lançar no mercado produtos, cuja propriedade protegiam desde o início, mas através de meios sofisticados que impediam a cópia ilegal dos seus produtos. Infelizmente, nos primeiros tempos o comportamento ético não foi favorável nem rentável a muitas empresas inovadoras e crentes na regulação e no funcionamento correcto das regras de mercado.
Em contrapartida, algumas outras empresas preferiram não proteger de forma sofisticada os seus produtos, “permitindo” que uns poucos pagassem e a maioria recorresse à sua cópia ilegal mas suficientemente intoxicante, para provocar o “vício” num cada vez mais vasto número de consumidores “agarrados” a esta espécie de droga. De seguida, quando o mercado monopolista já o permitia, decidiram finalmente proteger e “fidelizar” os seus clientes através de um combate feroz em favor do direito de propriedade do software e a uma atitude cínica de defesa da moral e dos bons costumes, usando a bandeira da luta contra a pirataria, que eles próprios haviam gerado, por razões de intoxicação do mercado.
A questão da propriedade no mundo da informática não se pode colocar numa luta de polícias e ladrões nem tão pouco numa simples querela partidária de esquerda e direita, como alguns a querem colocar, como se se tratasse de obras de arte, casas, carros, jóias, etc.
Do domínio da informática, a luta sobre as escolhas e a utilização do software do lado dos consumidores foi sempre uma luta contra o chamado “software proprietário”, em favor da abertura do código e para o cumprimento de normas abertas e partilhadas.
A história de todos os grandes impérios de fornecedores informáticos que a seu tempo se desmoronaram, tiveram a ver quase sempre com o seu “fechamento” e a sua recusa em entrar no mundo da partilha, da interoperabilidade e do cumprimento das normas co-optadas.
Só sobreviveram os que souberam fazer uma leitura, ao mesmo tempo realista e ética, da evolução tecnológica e das condições de sobrevivência a longo prazo neste sector de actividade.
A própria Internet nasceu e cresceu nessa luta e criou o maior império da história das TIC, baseado em comunidades abertas de partilha de conhecimento e na abertura e na normalização do seu código (HTML, XML, etc.) e dos seus requisitos de interoperabilidade (TCP/IP, etc.), de que todos hoje beneficiamos, quer sejam fornecedores quer sejam consumidores.
Hoje existem dois modelos de negócio: Um baseado na criação de ganhos, de curto prazo, através da Propriedade e outro baseado na criação de valor, a longo prazo, através da Inovação e do Conhecimento.
Cabe também aos Estados decidirem qual a política a seguir e se pretendem que o seu país seja um mero país de consumidores e parametrizadores de software, excluídos das verdadeiras sedes do conhecimento, ou um país de produtores de valor acrescentado através da partilha de conhecimento e o desenvolvimento de competências para a inovação.
Um Governo que abre as portas à intoxicação “gratuita” das suas escolas e universidades para o uso massificado de uma tecnologia proprietária, fechada e monopolista, para depois converter os jovens e o resto das comunidades numa sociedade totalmente “agarrada” e sem retorno, é um Governo que optou por estimular o caminho da pirataria e do facilitismo, em vez da abertura e da partilha do conhecimento que sempre foram aliadas da inovação e do desenvolvimento social e económico.

quarta-feira, novembro 01, 2006

Dois mundos ainda separados e paradoxais


Infelizmente ainda estamos a assistir à separação paradoxal entre dois mundos que se digladiam cinicamente há muitos anos, por um lado a nebulosa da estratégia do negócio, representada por gestores deslumbrados ou aterrorizados, e por outro a caixa preta da tecnologia, representada por “fadas milagrosas” a quem são dados recursos quase ilimitados ou “patinhos feios” de quem se espera que se façam “omoletas sem ovos”

quinta-feira, outubro 26, 2006

Um atraso de 20 anos nos serviços de cidadania

Desde 1997 que estamos à espera que se concretizem as medidas de classificação da informação do sector público, propostas no Livro Verde para a Sociedade de Informação (cidadania, desenvolvimento sustentado e valor acrescentado) e que se aumente o grau de digitalização dos activos informacionais do Estado.
Recentemente, e a título de exemplo, assistimos a um retrocesso de mais de 20 anos na disponibilização de informação de cidadania aos portugueses, com a fusão do Digesto ao Diário da República Electrónico e a consequente suspensão da pesquisa em texto livre a toda a legislação portuguesa, que estava disponível gratuitamente no Digesto desde 1986, nomeadamente na sua primeira versão denominada Infojur. Agora só se pode aceder gratuitamente aos textos legais, se soubermos com exactidão os números e datas dos diplomas, o que não pode ser propriamente considerado um “Informação de Cidadania”, nem tão pouco um “Serviço Público Universal e Gratuito” como vem sendo anunciado na página de acolhimento da INCM.
Quando estamos prestes a comemorar os 10 anos da publicação do Livro Verde para a Sociedade da Informação e 20 anos do Infojur / Digesto, é triste que, a pretexto de uma pretensa sustentabilidade financeira de uma empresa pública que sofre a substituição do papel pelos bits, se afaste o grande público de aceder à informação básica de um país - A legislação.

Competir com o mercado em tarefas não nucleares deve ter regras

Se o Estado, no domínio da prestação estrita de serviços de concepção, desenvolvimento e exploração de aplicações informáticas, tende a ser cada vez menos competitivo, tanto na eficácia e prontidão dos resultados, como na eficiência da utilização interna dos seus recursos técnicos, humanos e financeiros, deverá fazer convergir quanto antes os seus esforços e os seus cada vez mais limitados recursos para outras competências e prioridades progressivamente mais centradas na protecção da sua soberania exclusiva.
Sem dúvida que esta mudança tem custos de transição, mas não podemos esperar que vamos ter “sol na eira e chuva no nabal”, quando exigimos resultados aos organismos de SI/TI, sem lhes dar recursos financeiros que suportem o recurso adequado ao mercado e que sejam capazes de sustentar custos crescentes de funcionamento decorrentes de manutenções correctivas e evolutivas proporcionais aos investimentos efectuados anualmente em SI/TI. No final das contas os organismos mais empobrecidos acabam por recorrer a tarefas de desenvolvimento interno e ser impedidos de romper o ciclo vicioso duma programação de aplicações ad hoc, precipitada e cada vez menos qualificada, com reflexos altamente perversos no médio e longo prazo.
Para continuar a competir com o mercado em funções de engenharia, relacionadas com a concepção, desenvolvimento e exploração, devem-se exigir ao Estado pelo menos os mesmos requisitos de qualidade de processos que se começam a exigir às empresas contratadas em todo o mundo, nomeadamente no âmbito das normas ISO/IEC 15504 , CMMI e ITIL , mas, por razões de economia de competências, acreditamos que o futuro dos organismos de SI/TI da administração pública não passa por aí, mas por tarefas mais soberanas de planeamento, arquitectura e gestão.

domingo, setembro 17, 2006

A dificuldade de olhar os processos a partir do cidadão

Há mais de vinte anos que nos habituámos a ouvir e a disseminar uns dos princípios basilares da modernização administrativa – A necessidade de orientar a administração pública para as necessidades do cidadão. No entanto, este princípio ainda está muito longe de ser interiorizado nas atitudes e comportamentos da maioria dos políticos e responsáveis do sector público.
Trata-se acima de tudo de respeitar e aprender a valorizar a cidadania activa, enquanto parte integrante e indissociável da governação. O pensamento da gestão actual reforça a ideia que o maior erro das organizações públicas e privadas, mesmo quando têm ideias e produtos brilhantes e vencedores, é o distanciamento que continuam a manter em relação aos seus clientes, mesmo aqueles que lhes são mais fiéis.
O melhor modelo de gerar inovação é "sair para a rua". A nova "buzzword" para esta perspectiva de gestão chama-se "open innovation" (inovação aberta) ou inovação no sentido "outside-in" (de fora-para-dentro). A maior parte dos poderes públicos ainda olham o cidadão como um estorvo ignorante durante as fases de concepção e realização da modernização administrativa, alguém que só deve participar na fase final dos projectos simplesmente para os aplaudir.
Durante a concepção e a realização dos projectos de inovação e mudança a sociedade civil raramente é consultada e é quase sempre impedida de desempenhar um papel de verdadeira cidadania activa, pois os cidadãos continuam a ser tratados apenas como meros “administrados”, bem ao jeito do pensamento administrativo mais convencional e conservador.

domingo, agosto 20, 2006

Credibilidade dos SI/TI


Estudos recentes do Gartner sobre o prestígio do CIO (Chief Information Officer) nas organizações, coloca-o em penúltimo lugar no ranking de importância, apenas à frente do gestor de recursos humanos, quando paradoxalmente todos apregoamos que é necessário valorizar as pessoas e a informação como activos principais das nossas organizações. A maturidade do CIO nas organizações passa pela aceitação a confiança e o respeito pelos profissionais de SI/TI, que na maioria dos casos ainda estão a viver um clima de incerteza e cepticismo por parte dos colegas de outras áreas funcionais.

sábado, agosto 19, 2006

Estrutura TIC dos Ministérios


Fazendo uma relação entre funções, grau de soberania. externalização e tipo de relacionamento (parceria ou prestação de serviços), propõe-se uma base de reflexão para a estrutura dos departamentos de TIC de cada ministério, com funções de coordenação e produção.

Opções para os Serviços Partilhados e TIC na AP

Opção A – Serviços Partilhados Ministeriais sem incorporação das TIC nos SP do MFAP
Opção B – Serviços Partilhados Ministeriais com incorporação das TIC nos SP do MFAP
Opção C – Serviços Partilhados Centrais sem incorporação das TIC nos SP do MFAP
Opção D – Serviços Partilhados Centrais com incorporação das TIC nos SP do MFAP

sábado, julho 01, 2006

A propósito do Portal da Empresa inaugurado ontem pelo Primeiro Ministro

Em 1999 eu escrevia no livro "O Futuro da Internet" publicado pelo Centro Atlântico:

Imaginemos
Eu ligo o computador, ligo-me através da Internet ao Registo Nacional das Pessoas Colectivas, autentico-me perante o sistema, confirmo se o nome que quero registar já está atribuído e após várias tentativas a minha empresa fica definitivamente registada ao fim de alguns minutos, com as assinaturas digitais das duas partes (a minha e a do RNPC). Claro que tive de pagar emolumentos por este acto administrativo, mas usei o cartão de crédito com plena segurança.
Entretanto, sou notificado de imediato pela Administração Fiscal e pela Segurança Social, através de correio electrónico, para confirmar o início efectivo de actividade, fornecendo apenas alguns dados complementares e específicos para cada um destes sectores, sem necessidade de voltar a repetir os dados já anteriormente fornecidos ao RNPC.
O sistema podia ser mais complexo e no limite poderia envolver mais de uma dezena de intervenientes no processo de licenciamento do exercício de uma actividade empresarial (Ministérios da Economia, do Ambiente, da Saúde, da Agricultura, etc.).
Todo este processo seria baseado em comunicações automáticas entre as várias instituições, através de uma Extranet segura, com plena reutilização da informação, garantia de autenticidade e confidencialidade dos parceiros, integridade dos dados transmitidos através de redes e impossibilidade de cada um dos intervenientes repudiar mais tarde o seu envolvimento em todo o processo administrativo de constituição da nossa hipotética empresa.
Mas, se subsistissem dúvidas ligava-se ao Infocid, um serviço cada vez mais contextual e interactivo, em que através de mecanismos de inteligência artificial se procurava apoiar o cidadão e, se fosse necessário, ligava-se através do seu serviço de videoconferência a uma rede de Linhas Azuis especializadas e distribuidas através de call centers em todos os ministérios.
Não estamos a falar de dias, meses ou até anos para obter os resultados de um serviço público, estamos a falar de alguns minutos a partir de casa ou em frente a um quiosque multiserviços, dependendo apenas do tempo que o nosso hipotético empresário ocupasse na caracterização do seu negócio uma vez que a Administração Pública passou a ser rápida e eficiente nos seus processos internos e transparente e eficaz nas suas relações com a sociedade.

Fazer dos funcionários públicos trabalhadores do conhecimento


Modelo de Governance dos SI/TI na AP, à luz do PRACE

Devemo-nos ajustar aos novos tempos, através de novas missões e competências técnicas e gestionárias

Centralizar ou Federar não pode ser uma questão de fundamentalismo mas de clarificação política para a AP e para o Mercado


Investimento ou desperdício?


quinta-feira, maio 18, 2006

Entrevista para a jornalista Fátima Caçador


Ao longo dos últimos anos foram já apresentados pelo menos meia dúzia de planos para a modernização da AP através do uso das tecnologias, mais ou menos estruturados. Acha que o Simplex tem mais hipóteses de ser bem sucedido? Porquê? Quais as diferenças que vê neste programa?

No essencial o Simplex vem na sequência dos valores estratégicos e de muitas das iniciativas de modernização administrativa iniciadas há mais de 20 anos em Portugal e na linha das recomendações e das práticas prosseguidas na maioria dos países da OCDE desde essa altura.
Portugal tem tido nos últimos anos ciclos de euforia e desencanto nas várias iniciativas de modernização do aparelho do Estado, que se traduzem numa montra internacional de boas e más práticas administrativas.
O Simplex para já é uma recolha bem sistematizada e particularmente bem comunicada de intenções de mudança administrativa.
Num contexto em que a popularidade social e política parece que cresce com a maledicência em relação ao peso e à incompetência dos recursos humanos do sector público, o Simplex constitui uma nesga de esperança e um pedaço de céu azul no meio da trovoada em que a Administração Pública mergulhou nos últimos anos.

Liderou o Secretariado para a Modernização Administrativa que desenvolveu uma série de projectos. Na sua opinião foi cedo demais? O que falhou e o que foi bem feito?

Tratou-se de uma pequena equipa politicamente bem liderada que nunca abandonou o espírito de missão e que nunca se pretendeu institucionalizar com carácter permanente. Esse foi sem dúvida um dos seus valores mais preciosos a par de uma preocupação constante em envolver todos os intervenientes na mudança, incluindo as associações empresariais e outras organizações da sociedade civil. Eu próprio sempre me vi como um “casamenteiro” e um integrador de processos interdepartamentais, que no passado constituíam perfeitas heresias.
Algumas das iniciativas que foram revolucionárias na altura e que eu ajudei a criar e a propagar nos cinco continentes, hoje parecem-nos óbvias e irreversíveis, mas poderíamos ter ido muito mais além se tivéssemos respeito um pelos outros e soubéssemos valorizar e capitalizar todos os nossos activos de conhecimento e experiência. Tenho 34 anos de trabalho directamente relacionado com actividades de modernização administrativa e habituei-me a assistir a processos arbitrariamente descontinuados por sucessivas alterações políticas, os quais são mais tarde retomados ou reinventados a partir da estaca zero.
Parece um paradoxo, mas em Portugal por ser sempre demasiadamente cedo, tudo depois nos parece demasiadamente tarde.

Na sua análise, a AP está mal informatizada, mal interligada e estruturada em termos tecnológicos ou é sobretudo uma questão de processos e formação é por ai que tem de se começar? Qual é o seu diagnóstico?

A administração Pública está mais informatizada do que a generalidade do país, o problema não está na quantidade de tecnologia, mas no seu mau aproveitamento. A Administração Pública está dividida e fechada em múltiplos casulos tecnológicos, autoprotegidos e virados de costas uns para os outros.
Existe uma carência estrutural de competências de gestão, planeamento e concepção de arquitecturas de sistemas e tecnologias da informação. O Estado tem muito pouca consciência do que é e do que precisa e ainda não é capaz de alargar o espaço e o tempo da sua transformação através do uso intensivo e partilhado das tecnologias.
A estratégia ainda está centrada no aprovisionamento tecnológico e menos na concepção de um espaço arquitectónico ordenado e regulado para todo o sector público.
Mesmo no programa de reforma anunciado, ainda não ficaram claras a missões e as competências no âmbito dos sistemas e tecnologias da informação, que deveremos proteger de forma soberana e aquelas que se devem externalizar de forma mais eficiente e económica.

Comparativamente com o que se faz noutros países, em que ponto pensa que está Portugal na modernização de processos e na resposta ao cidadão?

Portugal tem perdido dinâmica desde o início do século. A passagem do ano 2000 constituiu uma alavanca de renovação para muitos países, mas a generalidade da administração pública portuguesa não aproveitou esta oportunidade de transformação. Não se pense que existem muitos paraísos na terra, pois o ser humano tem em todo o lado os mesmos defeitos e virtudes. Sem dúvida que os países que estão no topo da modernização dos processos administrativos, iniciaram há mais de dez anos um conjunto de iniciativas estruturantes, autosustentadas, capazes de resistir à tentação da reinvenção política e confiando e prestigiando os verdadeiros agentes da mudança que são os funcionários públicos.
Começámos como eles na mesma linha de partida, mas não soubemos passar o testemunho nas alturas decisivas.

Parece-lhe lógica uma abordagem de serviço ao cidadão muito virada para a Internet num país onde existe ainda uma tão grande divisão digital e uma penetração baixa do uso da Internet?

A universalidade do acesso aos serviços públicos electrónicos tem sido uma das minhas lutas há quase vinte anos. A inclusão social parece agora começar a ter lugar na agenda política, mas ao longo dos anos foram sendo destruídos alguns dos canais mais democráticos de acesso e até aqui pouco se aproveitaram as oportunidades que a Internet oferece como plataforma base para os serviços de carácter universal. É de louvar que se comece finalmente a reconhecer a importância das lojas virtuais do cidadão, chamadas de “Balcão Único” no Programa do actual Governo, podendo transformar cada um dos 18 mil pontos de contacto com o cidadão em todo o território português em centros únicos de formalidades (one-stop-shopping) ou lojas do cidadão de baixo custo. Se é aquilo que eu sempre defendi, trata-se de uma iniciativa que pretende transformar todos os actuais serviços de atendimento em centros de intermediação com funcionários preparados para o fornecimento universal e gratuito dos serviços electrónicos já hoje disponíveis para 35% da população privilegiada, tornando-os acessíveis a todos os restantes cidadãos info-excluídos do nosso país.

Quais os riscos que se correm com a abertura da informação pública ? Já o ouvi falar na caixa de Pandora....

Desde o Artº 268º da Constituição, passado pela Lei de Acesso aos Documentos da Administração, até chegarmos à transposição da Directiva 2003/98/CE, Portugal tem um enquadramento jurídico dos mais avançados no que se refere aos direitos de acesso à informação pública, no entanto, para além de se tratar de um direito quase ignorado pela generalidade dos cidadãos e agentes económicos, a administração pública ainda não passa de uma caixa de Pandora, pois desde 1997 que estamos à espera que se concretizem as medidas de classificação da informação do sector público, propostas no Livro Verde para a Sociedade de Informação e que aumente o grau de digitalização dos activos informacionais do Estado que se encontram por enquanto à espera de arquitecturas e repositórios partilhados e acessíveis de forma segura e transparente. Como na caixa de Pandora criaram-se muitas expectativas legislativas para uma informação de má qualidade guardada a sete chaves em muitos organismos públicos e incapaz de resistir ao efectivo exercício dos direitos de cidadania.

Defende o uso de software livre na AP. Acha que está a ser feito o suficiente nesse sentido?

Defendo o uso de software livre na administração pública, por razões que ultrapassam as poupanças financeiras. Trata-se de uma oportunidade para que Portugal passe a ser um parceiro activo na produção de software e deixe de ser um mero consumidor passivo de produtos importados, cujo valor começa a deixar de corresponder ao preço que somos obrigados a pagar. Trata-se também de uma oportunidade para trabalhar em redes e comunidades de prática, que muitos países já reconheceram como instrumentos preciosos de modernização administrativa. Por último, a soberania do Estado e os direitos de cidadania exigem cada vez mais transparência no código que está na base dos sistemas de informação que cada vez mais invadem o nosso quotidiano.
Constato que ainda se fez muito pouco no sentido da adopção do software livre na AP e que ainda existe muita hipocrisia quando se aborda este tema do ponto de vista estratégico. Tirando alguns casos mais arrojados como o Ministério da Justiça, ainda existe uma discriminação negativa em relação à adopção do software livre pela generalidade dos serviços públicos e tem-se desperdiçado muito do esforço universitário para a aquisição de competências adequadas ao seu desenvolvimento sustentado em Portugal.

A Direcção Geral de Informática Tributária e Aduaneira é uma das áreas onde a aplicação de tecnologia tem tido resultados mais visíveis. A que se devem?

Como em qualquer empresa, o Estado soube investir prioritariamente em áreas de captação de receita. Por outro lado, o Serviço de Informática Tributária e mais tarde a DGITA surgiram numa era em que já era evidente que o Estado se deveria concentrar mais no planeamento e na gestão dos sistemas e tecnologias da informação e menos no desenvolvimento de aplicações, passando a acreditar que o mercado estaria cada vez mais maduro e qualificado para intervir nas fases de informatização com menor risco e menos soberania. A informática tributária iniciou-se em 1977 no Instituto de informática e a DGITA foi uma herdeira de algumas das suas melhores práticas do início dos anos 80. Por outro lado, tratou-se de um organismo que soube importar do sector bancário alguns dirigentes de topo e através deles muita inovação e experiência que também a circunstância do desenvolvimento da Internet veio acelerar. Se olharmos para os vários estágios de maturidade no desenvolvimento do e-Government, a informática tributária soube progredir de forma sistemática até atingir hoje, nalguns casos, estágios de integração e transformação só alcançáveis nas administrações públicas mais desenvolvidos.

quarta-feira, maio 03, 2006

Não vale a pena re-inventar a roda


Sem preocupação de exaustão, aqui vai uma classificação das normas e metodologias mais relevantes para a Governação das tecnologias da informação
Numa fase em que se está a reorganizar o modelo de Governança dos SI/TI na AP, convém recordar e aplicar algumas normas

quarta-feira, abril 19, 2006

O ROI dos SI/TI num contexto de Reforma do Estado

Num contexto de Reforma do Estado, em que se presumem mais do que se avaliam resultados promissores e benéficos de uma progressiva externalização de certas funções relacionadas com a introdução das tecnologias da informação e comunicação no sector público, torna-se urgente mais do que nunca proceder ao desenho de uma cascata de arquitecturas transparentes e concertadas em relação ao que existe no presente (as is) e do que se pretende que venha a existir futuramente (to be) numa administração pública moderna, eficiente, eficaz e capaz de transformar o investimento público em benefícios para a sociedade.
Temos antes de mais de conhecer com exactidão as missões e as competências que se esperam do Estado e do sector privado no domínio das tecnologias da informação e comunicação, para que se consigam alinhar os critérios e as métricas mais adequadas à avaliação dos resultados de cada um dos actores no processo de modernização da sociedade portuguesa e em particular do sector público. Saber quem faz o quê, como se compra e como se partilham os sistemas e as tecnologias é um desafio para todos quantos esperam maximizar o retorno do investimento e alcançar benefícios reais para a soberania do Estado e para a prestação de melhores serviços aos cidadãos e aos agentes económicos.
Atirar para empresas privadas o que o sector público faz mal, sem previamente questionar a sua existência e sem criar um sistema regulador eficaz e sustentado, é perpetuar a manutenção de muitos serviços de racionalidade duvidosa, porém de rendimento garantido para os seus novos titulares.
Não queremos empresários públicos sem risco nem soberania de fachada, mas também não queremos um país em que o sector privado viva à sombra de um Estado mau comprador e se recuse a acrescentar valor à economia.
A qualidade e a quantidade do retorno económico, social e político, relativamente ao investimento efectuado em SI/TI, dependem em grande parte das competências que o sector público souber mobilizar para a aquisição e gestão de projectos. Não existem bons fornecedores sem bons compradores. Hoje existem normas e boas práticas que auxiliam os serviços da administração pública a avaliar a capacidade do mercado, desde o modelo SPICE da UE aos processos do CMMI-AM promovidos pelo Departamento de Defesa dos EUA.
Poderemos questionar o insourcing ou o outsourcing, todavia em qualquer dos casos nunca poderemos baixar a fasquia da qualidade no fornecimento de serviços, se quisermos maximizar o retorno do investimento. Será que sabemos quantas empresas portuguesas estão certificadas em níveis iguais ou superiores a 3 da escala de 5 do CMMI? Será que os nossos prestadores de serviços públicos e privados em SI/TI estão em condições de concorrer hoje entre si e no mercado globalizado?
As opções de investimento ainda são presumidas e baseadas em critérios pouco racionais. Por exemplo, nas áreas dos sistemas de gestão de recursos (ERP), poderemos saber a priori que cada cêntimo investido em SI/TI nas áreas tributárias se multiplica em aumento de receitas para o Estado, contudo ainda não se acredita que o investimento em SI/TI para o controlo da despesa pública ou para monitorizar e regular a externalização de serviços públicos se repercuta em benefícios efectivos para a tão desejada redução do défice.
Acreditamos que se o actual esforço na reforma do Estado e a consequente externalização de serviços públicos não forem acompanhadas por investimentos adequados em SI/TI para a sua monitorização e controlo, não nos deveremos surpreender com um efectivo aumento do défice estatal e com um retorno negativo em relação às expectativas traçadas.

quinta-feira, abril 13, 2006

“Vão ser os funcionários públicos os sujeitos da transformação”

Administração Pública (AP) portuguesa. Está tudo mal ou há zonas em que o Sol brilha?
Dizer que está tudo mal ou que está tudo bem faz parte do fundamentalismo muito característico da maioria dos portugueses quando são desafiados a emitir opinião à mesa de um café ou numa curta corrida de táxi. Alternamos com facilidade estados de euforia e desencanto e o quotidiano da administração pública portuguesa não poderia escapar a estes estados de alma bastante extremados e ciclotímicos.
É evidente que o Sol brilha em muitos serviços públicos, apesar do actual e generalizado estado depressivo devido à conjuntura de reforma do Estado em que vivemos. O choque traumático da mudança e a incerteza em relação ao futuro tanto podem mobilizar como deprimir a generalidade dos funcionários públicos.
Neste momento existe uma determinação clara dos responsáveis políticos em transformar as estruturas organizacionais do Estado e em acelerar alguns processos transversais que durante muito tempo pareciam intocáveis, mas ainda se está a actuar demasiado na camada superficial mediatizada e ainda não se conhece a profundidade da transformação que se anuncia e os verdadeiros benefícios e os riscos da mudança.

Quais devem ser os sentidos da modernização da AP?
Orientar a administração pública para os cidadãos e as empresas é uma prioridade da maioria dos países da OCDE desde meados dos anos 80. Depois de 10 anos pós-revolucionários, em que nos envolvemos na reconstrução do Estado para a democracia, Portugal tem tentado, nos últimos 20 anos, fazer um percurso cheio de avanços e recuos no sentido da modernização dos serviços públicos e na criação de uma verdadeira administração amiga dos cidadãos e das empresas.
Sem dúvida que a satisfação das necessidades de cidadania e o desenvolvimento económico do país deverão orientar as principais medidas de modernização da AP, mas existe ainda muito por fazer no domínio dos sistemas de gestão dos recursos humanos, financeiros e patrimoniais, que também é necessário mobilizar para esta transformação.
Conhecer a realidade da administração pública actual e perspectivar de forma clara uma visão de futuro passa pela existência de sistemas e repositórios de informação fiáveis, mas também por redes de pessoas e organizações que se disponham a cooperar e a não temer a perda de poder.

Diagnósticos e medidas. O que é necessário de uns e de outras?
A abundância de diagnósticos sobre o mau funcionamento dos serviços públicos é apenas aparente, pois na maioria dos casos conhecem-se os efeitos e os seus impactes, ignorando-se as verdadeiras causas do chamado peso do sector público.
Todos sabemos que existe excesso de peso no sector público se bem que esta gordura resulta sobretudo da redundância de recursos que se dispersam por quase todos os organismos do Estado e que também se repercute nas empresas que vivem à custa desta irracionalidade.
Do ponto de vista político, é muito tentador anunciar centenas de medidas de modernização administrativa, pois a quantidade ainda deslumbra mais que a qualidade. Trata-se quase sempre de dar palco a inúmeras vaidades departamentais dispersas e mal integradas.
Preferiria que o anúncio se limitasse a uma dezena de projectos integrados e mobilizadores, assim como a um conjunto de valores e medidas de política que orientassem estrategicamente a tão pretendida transformação dos serviços públicos, nomeadamente o suprimento de documentos e certidões inúteis na era digital, a partilha e a reutilização de informação, a racionalização de competências e tecnologias, o cumprimento de normas de interoperabilidade semântica e tecnológica, a segregação de poderes entre financiadores e gestores de projectos, etc.
A verdadeira mudança não se faz apenas nos centros de poder, mas sobretudo nos valores, nos comportamentos e nas atitudes de todos os intervenientes políticos e administrativos e na própria sociedade que passa a ter um comportamento cada vez mais ético e exigente em todo este esforço de transformação do país.

Processos e pessoas. Que relação deve existir entre estes dois pólos?
Desde há muitos anos que venho alertando para a necessidade de se proceder a um verdadeiro choque tecnológico e motivacional nos serviços públicos, como forma de suster uma tendência desde há muito previsível para a ruptura por razões de contenção do défice. Infelizmente não se têm acautelado simultaneamente estas duas dimensões do problema. O choque tecnológico parece estar aí, mas infelizmente o choque motivacional tem sido de sinal contrário. Os políticos e a sociedade continuam a estigmatizar negativamente a função pública e parece que todos se esquecem que vão ser os funcionários públicos os sujeitos desta transformação.
Os processos administrativos do futuro, para serem bem sucedidos, irão constituir coreografias bem sincronizadas entre pessoas e máquinas e deste equilíbrio depende o sucesso do país e a qualidade de vida dos seus cidadãos.
A evolução do trabalho do mundo analógico para a era digital, que se traduz na webização generalizada dos processos baseados no papel, constituirá sem dúvida uma revolução inevitável nos serviços públicos para os próximos anos. Os funcionários vão ter de se confrontar com novos paradigmas, em que os originais passarão a ser bits em vez de coisas e em que se assistirá finalmente ao desaparecimento das certidões e à sua substituição por intercâmbio de bits entre bases de dados que falam a mesma língua.
Para além da introdução generalizada das tecnologias, esta mudança implica sobretudo uma transformação profunda na cultura administrativa.

Cidadão e AP electrónica. É possível o diálogo fecundo?
O sucesso da administração pública electrónica depende muito da literacia da população e da universalidade dos canais de acesso aos serviços públicos electrónicos. Os quase dois terços da população portuguesa que ainda são alvo de exclusão digital têm direito a serviços electrónicos intermediados por funcionários dotados de novas competências cada vez mais polivalentes e orientadas ao atendimento de cidadãos que, por qualquer motivo, não têm acesso ao mundo digital.
Também as máquinas têm de evoluir para uma melhor e mais universal interacção com os cidadãos. Portugal foi pioneiro, desde o início dos anos 90, na disponibilização de interfaces fáceis e universais de interacção digital com o cidadão, no entanto não soube manter esta dinâmica.
O êxito e a eficácia dos serviços públicos electrónicos dependem da sua utilidade e usabilidade. No mundo digital tudo pode ser simplificado e personalizado.

“Cadelas apressadas parem cães tortos”. Porque aplica esta expressão à AP?
Trata-se de uma expressão em uso no meu Alentejo, que significa mais ou menos no resto do país “pôr o carro à frente dos bois”. A expressão aplica-se ao processo de transformação do funcionamento do Estado, quando se invertem as prioridades de mudança.
Quando o que está em causa é a introdução de tecnologias nos serviços públicos e quando se dispõe com demasiada facilidade de recursos financeiros para as adquirir, não é difícil assistirmos a uma compra desenfreada de infra-estruturas tecnológicas sem que estejam reunidas condições mínimas para a sua adequada rentabilização. Trata-se de tentar apressadamente criar soluções que depois vão à procura dos problemas.
Todos sabemos que as soluções tecnológicas estão disponíveis e que são fáceis de adquirir, mas será que estão criadas as condições organizacionais e semânticas necessárias para a sua adequada utilização?
No desenvolvimento da administração pública electrónica existem tarefas de retaguarda que estão longe da ribalta mediática, tais como a concepção de arquitecturas de gestão e de informação e a reengenharia de processos, que são condições indispensáveis ao sucesso aplicacional e tecnológico.
Num país em que as certidões de óbito ainda têm prazo de validade, existe demasiada pressa para gastar os fundos comunitários em tecnologias que rapidamente se podem transformar em grandes elefantes brancos, se os problemas que se visa solucionar não forem previamente equacionados e arquitectados. É nesta área que venho trabalhando fora das luzes da ribalta, tendo em vista criar na administração pública centros de competência orientados para a boa governança das tecnologias e para o desenho de arquitecturas orientadas aos processos administrativos.

O que é público ganha em ser privatizado?
É lamentável que os verdadeiros motivos para a privatização dos serviços públicos provenham de preconceitos e de um conjunto de interesses que giram em torno da administração pública em vez de se basearem em motivações racionais de aumento de economia, eficiência e eficácia do serviço público.
Quando se baralham e se trocam as expectativas entre o sector público e o sector privado, constroem-se referenciais e perspectivas desajustadas em relação à realidade actual e distorce-se a visão sobre o futuro dos serviços públicos.
Se o que se espera dos privados é acima de tudo criatividade, inovação, competitividade, risco e espírito de iniciativa para vencer nos mercados globalizados, o que a sociedade espera do sector público são principalmente qualidades de harmonização, clareza, simplicidade, segurança, confiança e estabilidade.
Quando se desvalorizam e se confinam as principais missões do Estado em organismos da administração directa cada vez mais descapitalizados técnica e financeiramente e quando se canaliza todo o prestígio e a maioria dos recursos para a administração indirecta e para o sector empresarial do Estado, não se está a privatizar, mas simplesmente a dificultar que a economia real funcione com regras de equidade e transparência.
Por outro lado, grande parte das empresas portuguesas vive à custa da irracionalidade do Estado, como já no século XIX constatou Eça de Queiroz. Atirar para empresas privadas o que o sector público faz mal, sem previamente questionar a sua existência e sem criar um sistema regulador eficaz e sustentado, é perpetuar a manutenção de muitos serviços de racionalidade duvidosa, porém de rendimento garantido para os seus novos titulares.
Não queremos empresários públicos sem risco nem soberania de fachada, mas também não queremos um país em que o sector privado viva à sombra do Estado e se recuse a acrescentar valor à economia.

Entrevista para a newsletter Interface "Altos Quadros", 10 de Abril de 2006

sexta-feira, abril 07, 2006

Moderação do Blog

Este Blog foi aberto à intervenção de todos, contudo cancelei a participação de anónimos pela sua inutilidade e retirei todas os textos que não se enquadravam nos objectivos que pretendi ao criar este espaço.
Reservar-me-ei o direito de moderar todas as intervenções que não tenham um carácter construtivo e dignificante a propósito do papel das TIC na modernização da AP.
Cultivo desde há muitos anos uma cidadania activa e acredito convictamente nas Redes e Comunidades de Prática.
Estarei sempre disponível para trocar ideias a propósito do papel das TIC na modernização da AP e do modelo de Governance dos SI/TI na AP neste e noutros espaços de diálogo, mas nunca com pessoas que se refugiam no anonimato.

quarta-feira, abril 05, 2006

"The II is dead, long live the II"

Através do PRACE aparentemente o Instituto e Informática (II) vai ser extinto na próxima lei orgânica do Ministério das Finanças e da Administração Pública (MFAP) após 29 anos de história notável, mas de forma surpreendente parece que ressuscita no Ministério do Trabalho e da Segurança Social (MTSS).
Estranha-se que no Relatório Bilhim o II tenha permanecido no MFAP e no Relatório do Governo tenha desaparecido.
No Relatório Bilhim o IIESS (Instituto de Informática e Estatística da Segurança Social) tinha-se convertido em Departamento de Informática do MTSS e no Relatório do Governo passou a designar-se Instituto de Informática (ponto!).
Espera-se que esta volatilidade e troca de nomes se esclareça rapidamente.
Aparentemente o Instituto de Informática do MFAP vai ser repartido em quatro partes:
  • Uma parte para o Departamento de TIC (Gestão e Desenvolvimento)?
  • Uma parte para a Agência para a Modernização Administrativa (Coordenação na AP e Normalização)?
  • Uma parte para a Unidade de Missão de Serviços Partilhados da AP (Exploração e Infra-estruturas)?
  • Uma parte para a DGITA, a quem surpreendentemente se abre a hipótese no Relatório Bilhim de alargar os seus serviços a outros organismos do MFAP (???)?
Entre outras, subsistem ainda muitas dúvidas no modelo de Governança dos SI/TI:
  • Os Serviços Partilhados da AP (Exploração e Infra-estruturas) que vão ser criados no MFAP irão ser apenas para o MFAP ou irão ser alargados a outros serviços da AP?
  • A Agência para a Modernização Administrativa vai criar um novo Centro ou vai reutilizar e partilhar as infra-estruturas tecnológicas com o MFAP?
  • Onde vai ficar a plataforma de Interoperabilidade e a autenticação dos funcionários públicos?

A bem dos critérios de Eficiência, Eficácia e Economia, espero que estas dúvidas se esclareçam rapidamente para que os serviços não se arrastem por mais quatro anos na incerteza e confusões de competências, como aconteceu nos dois governos anteriores.
O jogo tem de ser claro e justo. Não se pode continuar a assistir ao espectáculo deplorável de estrangulamento financeiro de organismos por parte de alguns centros de poder designados ad hoc e à pilhagem de recursos humanos de uns organismos em relação aos outros por escandalosos desequilíbrios de estatutos e privilégios entre os vários departamentos de SI/TI.
A Reforma do Estado não se pode basear em preconceitos, invejas e vinganças, mas numa racionalidade clara, coerente e equitativa.


PS: Ajudei o dr Fernandes Costa desde 1976 a criar o Instituto de Informática e fui o primeiro funcionário a tomar posse nesta instituição. Não será apenas como dirigente, mas sobretudo como um dos funcionários mais antigos desta casa que lamento profundamente a injustiça que está a ser cometida para todos quantos lá trabalham ou nela já trabalharam noutros tempos.

terça-feira, abril 04, 2006

Externalizar sem Arquitectar é aumentar a Despesa Pública


O modelo de governança para os sistemas e tecnologias da informação (SI/TI), proposto pelo Governo no dia 30 de Março, parece ainda muito pouco consistente e desfocado em relação ao mandato do PRACE e às expectativas de clarificação que se tinha em relação a este trabalho:
• Aguardava-se uma maior clarificação das funções do estado e do mercado em relação aos SI/TI;
• Aguardava-se uma maior clarificação sobre as competências a desenvolver e a reter na administração pública ou a descartar para o sector privado, em relação aos SI/TI.
Parece que sabemos quem vai mandar e quem vai fazer, no entanto não sabemos quem vai Planear / arquitectar os recursos informacionais e os SI/TI e com que competências.
Propõe-se um modelo que centraliza Políticas e Estratégias TIC (entendidas com normas de interoperabilidade e segurança, etc.), deixando para os ministérios funções tradicionais relacionadas com três níveis centrados sobretudo no desenvolvimento e exploração aplicacional:
Gestão (Planeamento, Controlo e Avaliação TIC);
Desenvolvimento (Concepção, Contratação e Apoio ao Desenvolvimento e Manutenção de Aplicações);
Exploração (Operação e Administração de Sistemas e Implementação e manutenção de infra-estruturas tecnológicas).
ONDE ESTÃO E QUEM VAI ELABORAR E NEGOCIAR AS TÃO NECESSÁRIAS ARQUITECTURAS DOS SI/TI DO ESTADO?
Este modelo poderia ter sido feito há 30 anos, mas os tempos, as tecnologias e os contextos metodológicos mudaram.
Tudo levaria a crer que se estava a caminhar para uma maior soberania do sector público nas competências político-estratégicas e de gestão e a uma progressiva externalização das actividades de desenvolvimento e exploração de sistemas, no entanto continuamos a assistir a contradições e inconsistências na aplicação do modelo proposto:
• Extinguem-se institutos públicos nalguns ministérios (Finanças e Saúde) e mantém-se noutros (Segurança Social e Justiça);
• Propõem-se Agências, Institutos Públicos, Direcções Gerais, Departamentos, Secretarias-gerais, Unidades de Serviços Partilhados, etc., para fazer basicamente o mesmo com recursos diferentes e estatutos remuneratórios e privilégios que variam de 3 para 1;
• Aparentemente recomenda-se a partilha de serviços, mas criam-se novas estruturas para o mesmo fim (plataformas de interoperabilidade, segurança, etc).
• Tem-se uma visão estritamente centrada nos investimentos tecnológicos e não na gestão da informação enquanto recurso fundamental para o exercício da soberania do Estado e para a prestação de serviços públicos.

ATENÇÃO:
Através da externalização dos SI/TI sem um correspondente reforço da capacidade interna de Planear e Arquitectar os SI/TI existe uma forte probabilidade de aumento da Despesa Pública.
A irracionalidade do Estado alimenta cerca de 60% das empresas de SI/TI.
Será que queremos corrigir ou reforçar esta tendência?





quarta-feira, janeiro 11, 2006

Onde está a Governança dos SI/TI na Administração Pública

Estamos muito longe de alcançar níveis aceitáveis de Governança dos SI/TI
Dos modelos mais centralizadores ou fragmentados e de uma atitude mais orientada à acção ou à estratégia, o que é um facto é que ainda vivemos demasiado em estágios voluntaristas ou em autênticas arenas políticas, que nada têm a ver com a maturidade do Planeamento, Arquitectura e normas que são necessárias para o bom uso dos SI/TI, bem como a generalização de serviços partilhados na AP.
Os interesses e as expectativas dos vários actores não são convergentes e por isso é urgente responder às questões de boa governança:
O quê, Como, Onde, Quem, Quando, Porquê?..., a nível cultural, organizacional,semântico e tecnológico

domingo, janeiro 08, 2006

Inovar desertificando? Não!

Poderia chamar-lhe o efeito eucalipto. Estamos muito longe de alcançar níveis aceitáveis de governação dos SI/TI. Dos modelos mais centralizadores ou fragmentados e de uma atitude mais orientada à acção ou à estratégia, o que é um facto é que ainda vivemos demasiado em estágios voluntaristas ou em autênticas arenas políticas, que nada têm a ver com a maturidade do planeamento, arquitectura, gestão e normalização que são necessárias para o bom uso dos SI/TI.
Infelizmente tem-se tentado inovar muitas vezes na Administração Pública ignorando-a e empobrecendo-a. Por isso temos chamado de “efeito eucalipto” a esta sucessão de iniciativas, só por si desertificadoras, de tudo o que ainda está vivo e funciona à sua volta. Criam-se camadas de estruturas novas, sem se rever ou sequer integrar as anteriores, multiplicando-se a espiral de custos acumulados e empobrecedores do país.
Ignoram-se as condições de governação, ignoram-se os intervenientes, ignoram-se os sistemas reguladores e ignora-se o sistema objecto que se pretende transformar. Assim não se cria inovação sustentada e não melhoramos o futuro dos portugueses. Apenas construímos uma feira de vaidades efémeras e incapazes de encarar o futuro. São exemplos deste voluntarismo desgovernado alguns sistemas estruturantes e horizontais como as compras electrónicas, os ERP, a factura electrónica, entre outros.